A HARMONIA CÓSMICA
Ciência e Tecnologia

A HARMONIA CÓSMICA


Coluna Física sem Mistério

Ciência Hoje On-line
19/09/2006

A beleza e a harmonia das formas são características que sempre procuramos identificar ao nosso redor. As formas perfeitas e simétricas sempre nos chamam mais a atenção que os objetos que não apresentam essas características. Um belo rosto é sempre aquele que traz as formas mais proporcionais, simétricas e harmoniosas. Platão associava o belo ao bom. Para esse filósofo, a beleza absoluta, que seria imutável e universal, estaria relacionada à ordem, à simetria, à harmonia e às proporções equilibradas. Ao fazer essa associação, chegava a considerar que o bem supremo seria a junção de um corpo belo com uma mente bela.

A busca da harmonia também alcançou os céus. Pitágoras, no século 6 a.C., construiu uma teoria da harmonia das esferas celestes, na qual havia uma consonância das notas que os astros produziriam em seus movimentos regulares. O cosmos todo executaria uma música universal – a música das esferas.

Ele percebeu que os sons musicais harmoniosos são emitidos por uma corda vibrante cujo comprimento é dividido segundo proporções simples, ou seja, existe uma relação entre sons harmoniosos e números inteiros. Reduzindo-se o comprimento da corda de um violão à metade, esta passa a emitir um som uma oitava acima, isto é, com o dobro da freqüência. Dessa forma, para Pitágoras, relações desse tipo indicavam que “todas as coisas eram números inteiros”.

A busca pela harmonia cósmica prosseguiu com um dos mais importantes cientistas de todos os tempos: o alemão Johannes Kepler (1571-1630). Segundo consta, durante uma das suas aulas na Escola Luterana de Graz, na Áustria, em 1594, Kepler considerou que não deveria ser uma simples coincidência o fato de existirem apenas cinco sólidos regulares – tetraedro, cubo, octaedro, dodecaedro e o icosaedro, com 4, 6, 8 12 e 20 faces, respectivamente – e seis planetas conhecidos na época – Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno.

Ele imaginou que cada um desses sólidos geométricos estaria circunscrito por uma esfera, de forma a obter seis esferas concêntricas com raios que seriam iguais às trajetórias circulares dos planetas em torno do Sol, colocado no centro desse arranjo. No entanto, como sabemos atualmente, o modelo proposto por Kepler é apenas belo e não representa a realidade, pois existem outros planetas no nosso Sistema Solar e mais de uma centena orbitando outras estrelas. Contudo, esse modelo permitia obter o raio das órbitas dos planetas com uma precisão da ordem de 5%.
A procura pela harmonia cósmica pode ser entendida, nos dias de hoje, como a busca por leis físicas fundamentais que, em princípio, descrevam todos os fenômenos da natureza. Conhecemos atualmente quatro forças fundamentais: gravitacional, eletromagnética, nuclear forte e nuclear fraca. Todas essas forças moldam o nosso universo.

As quatro forças fundamentais

A gravidade é a mais importante para os processos em grande escala, pois determina os movimentos das galáxias, estrelas e planetas, bem como nos mantém presos à superfície da Terra. Por meio da força eletromagnética, átomos e moléculas se combinam e formam toda a matéria conhecida. As forças nucleares fortes e fracas determinam a estrutura do núcleo atômico, sendo que a primeira é responsável pela coesão do núcleo e a segunda pelos processos de decaimento radioativo.

Existiria ainda uma quinta força que atua apenas no universo na escala de bilhões de anos-luz e funciona como se fosse uma “antigravidade cósmica” que controla a expansão do universo. Contudo, ainda não se tem uma explicação definitiva sobre ela. Três dessas forças (eletromagnética, nuclear forte e fraca) são explicadas no âmbito da mecânica quântica, enquanto a gravidade é explicada pela teoria da relatividade geral de Einstein. Essas duas teorias não conseguem ser compatibilizadas, pois partem de idéias e princípios totalmente distintos. A primeira descreve o universo na escala atômica, e a segunda, na escala cósmica.
O "Santo Graal" da Física

Até o momento, não houve sucesso em encontrar uma teoria que descreva a harmonia cósmica por completo. Uma das tentativas para resolver esse desafio é a chamada “teorias de cordas”, na qual os blocos fundamentais da natureza seriam “cordas” com dimensão na ordem de 10 -35 metros que vibrariam no espaço e no tempo.

Nessa proposta, seria possível se obter uma única teoria que reunisse a gravidade e as outras forças da natureza, desde que o universo tivesse dez dimensões espaciais e uma temporal, explicando assim as características da forças fundamentais da natureza. Entretanto, ainda não foi possível verificar experimentalmente as previsões feitas pelas teorias de cordas. Espera-se que nos próximos anos sejam descobertas as primeiras evidências da existência desses entes físicos.

Talvez a teoria das cordas seja o “Santo Graal” da Física. Seria como voltar à música das esferas proposta por Pitágoras há 2500 anos. Desta vez, as notas da sinfonia cósmica seriam tocadas por cordas que vibrariam muito além da nossa percepção cotidiana. Contudo, nem sempre a beleza reflete a realidade e, talvez, essa teoria seja apenas mais um dos sonhos em busca da beleza eterna e imutável



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