O mistério da escuridão da noite
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O mistério da escuridão da noite


Publicado no AOL-Educação em 22/06/2005


Nas noites de inverno, em época de Lua Nova, em locais onde não há poluição atmosférica ou luminosa, é possível observar milhares de estrelas no céu. Observamos que entre as estrelas existe apenas escuridão, com exceção de uma região esbranquiçada do céu onde existe uma grande concentração de estrelas, na direção do centro da Via-Láctea.

Desde épocas imemoráveis, a humanidade olha para o céu e tenta compreender os seus mistérios. Olhar para as estrelas sempre inspirou os poetas e os apaixonados a expressarem os seus sentimentos. Pode-se dizer que essa sempre foi uma busca por si mesmo. Contudo, não é sobre as estrelas que vou escrever, mas sim sobre a escuridão que há entre elas. Embora a escuridão e o vazio possam inspirar medo e solidão, no caso particular da negritude do céu noturno, esta pode nos revelar segredos relacionados com as nossas próprias origens.

Por volta do ano de 1600, o astrônomo e matemático alemão Johannes Kepler percebeu que a escuridão do céu noturno era fenômeno que não deveria acontecer, pois se imaginarmos que o universo é infinito e é preenchido por infinitas estrelas, o céu noturno deveria ser muito brilhante.

No século XIX, em 1823, outro astrônomo alemão, Henrich. W. M. Olbers, formalizou esse problema mais objetivamente. Essa questão ficou conhecida como o “paradoxo de Olbers”.

Num primeiro momento, a resposta parece óbvia. O céu noturno é escuro porque o Sol não o ilumina durante a noite. Entretanto, uma reflexão mais profunda nos leva a outra resposta perturbadora. Na época de Olbers, a concepção vigente sobre o universo era que ele seria estático e infinito. Se fosse assim, deveriam existir infinitas estrelas no firmamento. Dessa forma, para qualquer direção no céu que olharmos, deveríamos encontrar uma estrela. Essa situação é análoga a quando estamos em uma floresta muito densa. Para qualquer direção que olharmos, encontraremos uma árvore, bloqueando completamente a nossa visão. Portanto, o céu noturno deveria ser completamente iluminado.

Um argumento que poderia ser utilizado para contestar esse fato seria que a luz das estrelas mais distantes ficaria mais tênue quando chegasse até nós. Essa foi a resposta que Olbers propôs para o paradoxo. A luz das estrelas, que é uma forma de radiação eletromagnética, perde intensidade proporcionalmente ao quadrado da distância do observador. Entretanto, o volume do universo e, portanto, o número total de estrelas, aumenta de acordo com o cubo da distância (o volume da esfera depende do cubo do raio). Embora as estrelas esmaeçam com o aumento da distância, esse efeito seria compensado pelo número crescente de estrelas.

Mas, afinal de contas, por que a noite é escura?

O paradoxo de Olbers somente pode ser explicado se considerarmos que o nosso universo teve um início. Os dados observacionais que possuímos atualmente indicam que o nosso universo foi criado há cerca de 15 bilhões de anos. Somente podemos observar estrelas - e outros objetos cósmicos - que se encontram no máximo à distância de 15 bilhões de anos-luz (um ano luz equivale a aproximadamente 10 trilhões de quilômetros). Essa distância embora muito grande, é finita. O volume observável do universo contém na ordem de 400 bilhões de galáxias, sendo que cada galáxia possui aproximadamente 100 bilhões de estrelas. Portanto, estima-se que há cerca de um sextilhão de estrelas (10 seguidos de 21 zeros!). Embora esse número seja enorme, ele é finito.

Outro fato que deve ser considerado para explicar a escuridão da noite é a expansão do universo. Na década de 1920, o astrônomo americano Edwin Hubble descobriu que as galáxias mais distantes estavam se afastando uma das outras. Ele fez essa descoberta a partir da constatação de que a luz emitida por essas galáxias tinha um deslocamento para o vermelho. Esse efeito, conhecido como Doppler, ocorre devido ao afastamento da fonte que está emitindo o foco luminoso, tornando-se importante quando a fonte estiver movendo-se com velocidades próximas a velocidade da luz. Nesse caso, as ondas eletromagnéticas têm o seu comprimento de onda aumentado (ou as freqüências diminuídas). Essas luzes estelares, vindas dos confins mais remotos do universo observável, acabam ficando cada vez mais atenuadas, e, portanto, diminuindo sua intensidade. A constatação da expansão do universo levou a elaborar um modelo que explica a sua origem, como já discutimos anteriormente (leia a "Busca pelo começo")

A idade finita e a expansão do universo influenciaram diretamente a existência da vida em nosso planeta. Se a noite não fosse escura, o excesso de luminosidade e radiação poderia ter impedido o desenvolvimento da vida na Terra, ou poderia tê-la levado a outros caminhos evolucionários, ou seja, um universo infinito e que sempre existiu provavelmente não permitiria a existência de seres como nós que refletimos sobre a sua natureza e origem.




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