Ciência e Tecnologia
A matéria em diferentes escalas
Coluna Física sem mistério
Ciência Hoje on-line
publicada em 22/06/2012
Em diversas oportunidades nesta coluna, falamos sobre planetas, estrelas e galáxias. Em outros momentos, também abordamos temas como átomos e moléculas, que, ao interagirem, dão forma a tudo que percebemos ao nosso redor. Também discutimos como o homem pode manipular tais estruturas fundamentais e produzir novos materiais que modificaram (e modificam) as nossas vidas.
Em um primeiro momento, podemos pensar que a vastidão do cosmos e complexidade dos átomos não estão conectadas. Afinal, as galáxias localizam-se a milhões ou até bilhões de anos-luz de distância (um ano-luz representa a distância que um raio de luz percorre durante um ano e equivale a aproximadamente 10 trilhões de quilômetros) e são necessários gigantescos telescópios para detectar a fraca luz que nos chega a partir desses objetos.
Por outro lado, as estruturas fundamentais da matéria são tão pequenas, da ordem de décimos de nanômetro (um nanômetro é um bilionésimo do metro), que somente são acessíveis com poderosos microscópios eletrônicos, que, mesmo assim, nos mostram apenas uma pequena parte de toda a sua complexidade.
Tanto as estrelas das galáxias quanto uma folha de árvore são feitas de átomos. Os átomos são basicamente constituídos de prótons (partículas com carga elétrica positiva) e de nêutrons (sem carga elétrica) – que formam o núcleo atômico – e de elétrons (partículas com carga elétrica negativa). Estes se mantêm presos ao núcleo atômico devido à atração elétrica entre suas cargas e as dos prótons (também chamada de atração coulombiana).
Simplicidade estelar
Os átomos que compõem as estrelas das galáxias, em sua maior parte, são os mais simples da natureza: o hidrogênio e o hélio. O hidrogênio tem apenas um próton em seu núcleo e o hélio, dois prótons e dois nêutrons. Devido às altas temperaturas em que eles se encontram no interior das estrelas, esses átomos estão completamente ionizados, ou seja, seus elétrons não estão mais ligados ao núcleo atômico e a matéria permanece em um estado particular que chamamos de plasma.
No núcleo de uma estrela, a temperatura atinge dezenas de milhões de graus Celsius. Nessa condição extrema, os núcleos de hidrogênio se movem com tanta velocidade – com altíssimas energias – que conseguem vencer a repulsão elétrica que existe quando duas cargas com o mesmo sinal se aproximam.
Quando eles se aproximam a uma distância da ordem de 10-15 metros, outra força fundamental da natureza entra em ação: a força nuclear forte. Essa força é a mais intensa que existe no universo (cerca de 100 vezes mais intensa que a força elétrica), porém o seu alcance é muito limitado (10-15 m).
Quando quatro átomos de hidrogênio colidem, ocorre a formação de um núcleo do átomo de hélio.
Nesse processo, dois prótons (que são núcleos dos átomos de hidrogênio) se transformam em dois nêutrons e são emitidas duas partículas com a mesma massa do elétron, mas com carga elétrica positiva, às quais se denomina pósitron.
O núcleo do átomo de hélio e as partículas produzidas nesse processo têm massa menor do que a dos quatro prótons de hidrogênio iniciais. A diferença de massa é convertida em energia, como previsto pela equação de Einstein E=mc2, na qual m é a diferença de massa e c a velocidade da luz. Como c tem um valor muito grande, uma pequena quantidade de massa equivale a uma enorme quantidade de energia.
Uma estrela como o Sol transforma, a cada minuto, algo em torno de 36 bilhões de toneladas de hidrogênio em hélio, liberando uma energia equivalente à queima de 8×1020 (oito seguido por 20 zeros) litros de gasolina por minuto, ou mais de 10 milhões de vezes a energia derivada da produção anual de petróleo da Terra.
Esse processo continua ocorrendo em uma estrela durante bilhões de anos. O Sol, por exemplo, existe há mais de 5 bilhões de anos e continuará brilhando ainda por outros 5 bilhões. A transformação de núcleos atômicos também acontece em estrelas com mais massa que o Sol e forma átomos mais complexos, como o carbono, o oxigênio, entre outros.
Complexidade ao nosso redor
As condições em que vivemos no nosso planeta permitem que os átomos que estão ao nosso redor se combinem e formem estruturas mais complexas e estáveis, que chamamos de moléculas. Nesse caso, quem domina é a força de interação entre os elétrons, que possibilita a combinação de diferentes tipos de átomos.
Por exemplo: a molécula da água, que é composta por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio (H2O), tem uma estrutura molecular muito simples que lembra um ‘V’ aberto, com o átomo de oxigênio no seu vértice e os átomos de hidrogênio nas pontas. Essa estrutura ocorre devido à repulsão elétrica (chamada de repulsão coulombiana) existente entre esses átomos, que estão unidos por uma ligação química denominada covalente.
Tanto o hidrogênio como o oxigênio são átomos pequenos, que tornam a molécula da água leve. As moléculas de água se ligam entre si por meio de uma ligação química conhecida como ponte de hidrogênio. Se não fosse esse tipo de ligação, a água seria um gás em temperatura ambiente e ficaria líquida apenas em baixas temperaturas.
Combinações não tão simples entre átomos de carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio etc. permitem formar moléculas tão complexas como as de DNA (ácido desoxirribonucleico), que são a base da vida. Em certas condições, essas moléculas são capazes de se copiar e, assim, permitir o surgimento de estruturas ‘vivas’ tão complexas como nós.
Seja nas estrelas – tanto as próximas quanto as das distantes galáxias –, seja na Terra, as leis que regem a ‘química nuclear’ são as mesmas. A matéria, em suas diferentes formas, é constituída do mesmo modo em todos os lugares do universo. Apenas as transformações e combinações dos átomos são diferentes. E são as condições locais que permitem o surgimento dessa grande variedade de estruturas, desde microscópicas formas de vida até gigantescas estrelas.
Adilson de Oliveira
Departamento de Física
Universidade Federal de São Carlos
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