Ciência e Tecnologia
Um brilho em nossas vidas
Coluna Física sem mistério
Publicada no Ciência Hoje On-line
22/12/2006
Na maioria das cidades, as noites de dezembro costumam ser mais brilhantes. Devido às festas natalinas e de final de ano, as ruas, praças, casas, prédios etc. ganham iluminação especial embelezando as noites. Essas cores e brilhos muitas vezes têm o objetivo de imitar as estrelas. Nessa época do ano, de alguma maneira, desejamos estar mais próximos do céu, pois sempre o associamos ao divino e ao mágico. Olhar para o céu e descobrir seus segredos é um desafio que estimula a humanidade há milênios. Entender as estrelas é também compreender um pouco de nós mesmos.
Parte do mistério da nossa existência na Terra está, de certa forma, escrito nas estrelas. Quando o universo surgiu, há aproximadamente 15 bilhões de anos, o hidrogênio e o hélio foram os únicos elementos químicos criados. Os outros 90 que encontramos em nosso planeta foram sintetizados, há bilhões de anos, no interior de alguma estrela. Para permitir que existamos aqui, uma estrela teve que morrer.
As estrelas se formam no interior de gigantescas nuvens de gases e poeira denominadas nebulosas. A força da gravidade – a mesma que nos mantém presos à superfície do nosso planeta – faz com que o hidrogênio e o hélio se acumulem, formando regiões com maior densidade. À medida que ocorre o acréscimo de massa nessas regiões, a intensidade da força gravitacional também cresce (pois ela depende da quantidade de massa), atraindo mais partículas e aumentando a freqüência de colisões entre elas em altas velocidades. Nesse processo, a energia de movimento das partículas se transforma em calor, aumentando a temperatura. Nesse estágio, temos uma proto-estrela.
Passados alguns milhões de anos, a temperatura alcança milhões de graus Celsius. Quando se atinge essa condição, começa a ocorrer o processo de fusão nuclear. Inicialmente, quatro núcleos de átomos de hidrogênio (que possui apenas um próton) se transformam em um átomo de hélio. Para tal, ao longo dessa reação dois prótons se transformam em nêutrons, emitindo dois pósitrons (partícula com a mesma massa do elétron, mas com carga elétrica positiva).
O saldo desse processo é que a massa do núcleo de hélio é menor que a massa inicial dos quatro núcleos de hidrogênio. Essa diferença de massa se transforma em energia, de acordo com a equação de Einstein – E=mc 2 . A partir desse momento a estrela nasce e manterá seu brilho às custas da energia dessa reação.
Contração x expansão
Na maior parte da sua vida, a estrela permanece em equilíbrio, devido ao balanço entre a força gravitacional, que tende fazer com que ela se contraia, e a pressão gerada pela alta temperatura, que tende fazer com que ela se expanda. É como se fosse um cabo de guerra, na qual duas forças competem uma com a outra.
O tempo de duração desse equilíbrio depende da massa inicial: estrelas como o Sol ficam nesse estágio por cerca de 10 bilhões de anos. Quando acaba o hidrogênio disponível para manter os processos de fusão nuclear, a estrela começa a se contrair, aumentando a pressão e a temperatura. Com isso, ela passa a realizar a fusão dos núcleos de hélio, transformando três deles em um núcleo de carbono e liberando energia.
Assim, cada vez que não há mais núcleos disponíveis para manter os processos de produção de energia, a estrela novamente se contrai para aumentar a temperatura e forma elementos cada vez mais pesados. Dependendo da sua massa inicial, ela sintetiza determinados elementos químicos. No caso de estrelas com a massa do Sol, esse processo se encerra no carbono.
ntretanto, nem todos os elementos se formam dessa maneira. Para estrelas com mais de 10 vezes a massa do Sol, como as gigantes azuis, quando começa a se formar o ferro no interior estelar, não há mais liberação de energia; ao contrário, esse processo consome energia e esfria a estrela ainda mais. Nesse caso, o processo final de contração é tão intenso que leva a um gigantesco colapso.
Nesse caso, a matéria fica tão comprimida que os elétrons são empurrados para os núcleos atômicos de forma que eles reajam com os prótons, transformando-se em nêutrons. Nessa situação ocorre um dos eventos mais violentos do universo: a estrela explode e libera, em apenas alguns meses, uma quantidade enorme de energia, equivalente à que ela levaria alguns milhões de anos para emitir, brilhando mais do uma galáxia inteira. Os elementos mais pesados são produzidos durante esse processo. Chamamos tal acontecimento de supernova.
Esses fenômenos ocorrem tipicamente a cada 100 anos em nossa galáxia. Em 1987 ocorreu uma explosão de supernova na galáxia conhecida como Grande Nuvem de Magalhães, que é uma galáxia satélite à nossa. Esse evento pôde ser observado a olho nu. Outras supernovas foram observadas, como aquela avistada em 1054 por astrônomos chineses. Hoje, na posição em que eles registraram a “estrela visitante”, observamos a Nebulosa do Caranguejo. No seu interior existe uma estrela composta apenas de nêutrons, o resto da supernova.
A estrela de Belém
Curiosamente, no ano 5 a.C. os chineses também relatam o aparecimento de uma estrela nova no céu na constelação do Capricórnio. Algumas pessoas relacionaram esse fato com a famosa estrela de Belém que teria anunciado o nascimento de Cristo. Como existem controvérsias sobre essa data, tal evento poderia ter sido utilizado no relato bíblico. Contudo, não foi encontrada nenhuma evidência de uma supernova naquela região do céu.
Mais do que pontos brilhantes no céu, as estrelas, que iluminam a noite e a nossa imaginação são verdadeiras fontes criação no universo. Cada átomo que temos em nossos corpos um dia foi formado no interior de uma estrela há bilhões de anos. O brilho intenso que anuncia a morte de uma estrela também representa a possibilidade do nascimento de outras. De certa forma somos “filhos das estrelas”. Como nos dizem os versos do poeta Olavo Bilac: “Amai (as estrelas) para entendê-las!/ Pois só quem ama pode ter ouvido/ Capaz de ouvir e de entender estrelas.”
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A coluna Física sem Mistério é publicada na terceira sexta-feira do mês pelo físico Adilson J. A. de Oliveira, professor da UFSCar
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